Laban Rutagumirwa recarrega o seu celular utilizando uma bateria de automóvel, porque a casa de piso de terra na qual ele vive, em meio às remotas colinas cobertas de bananais que caracterizam a região oeste de Uganda, não tem acesso à rede elétrica.
Quando a bateria se esgota, Rutagumirwa, agricultor, 50 anos, caminha por mais de 6 Km para recarregá-la, de modo que possa manter sua posição como pólo central de comunicação e como pessoa que auxilia os vizinhos rurais no combate de pragas que prejudicam a produção de bananas. Em uma região na qual a eletricidade é escassa e a conexão com a internet é algo que praticamente não existe, o celular serviu para revolucionar a capacidade dos cientistas para acompanhar pragas agrícolas e informar aos agricultores de regiões remotas sobre os mais recentes avanços científicos para combatê-las. Com seu celular, Rutagumirwa tira fotos digitais, determina coordenadas utilizando o sistema de posicionamento global e armazena os questionários de 50 perguntas respondidos por agricultores vizinhos cujas bananeiras estejam enfrentando problemas. Ele envia todos os dados obtidos a cientistas na capital do Uganda, Kampala, por meio de mensagens instantâneas. "Nós nem fazíamos ideia de que fosse possível obter informações usando o celular", disse Rutagumirwa. "Era um grande mistério para nós. Mas agora temos todos a cabeça aberta com relação a isso". A África representa o mercado de telefonia móvel de maior crescimento no mundo. Empresários e organizações de assistência ao desenvolvimento estão se esforçando avidamente por aproveitar as oportunidades que esse ritmo acelerado de crescimento propicia. Elas estão criando aplicativos de telefonia móvel para empresas com e sem fins lucrativos em todo o continente. Milhões de africanos, por exemplo, usam seus celulares como ferramenta para transmissão de dinheiro, para acionar poços artesianos, para se informar sobre os placares de jogos de futebol e para comprar e vender bens. A penetração da telefonia móvel é muito maior que a da internet, na África, especialmente nas regiões rurais, o que a torna a mais acessível ferramenta de comunicação, segundo Jon Gossier, fundador e presidente da Appfrica, uma companhia de tecnologia sediada em Uganda. A recente instalação do primeiro de uma série de cabos submarinos de comunicação que conectarão o leste da África a redes de internet de banda larga despertou esperanças de avanço no tráfego de rede de alta velocidade em Uganda e nos países próximos. Mas Gossier afirma que aplicativos para mensagens em celulares continuariam a ser necessários por ainda diversos anos. O desenvolvimento de conteúdo local e útil para a web só vai acontecer depois que os preços de conexão se reduzirem, e isso provavelmente deve demorar mais de um ano, estima ele. "Não acredito que o desenvolvimento que temos em curso para celulares no momento vá se deter", disse Gossier, "mas creio que teremos toda uma nova geração de aplicativos criados na África, entre os quais aplicativos de telefonia móvel que usam a web". Acompanhar as pragas agrícolas que afetam a banana e educar os agricultores sobre como proteger suas plantações estão entre os objetivos de diversos aplicativos que vêm sendo testados em regime de programa-piloto em Uganda pela Fundação Grameen, uma agência não governamental que planeja reduzir a pobreza por meio de microfinanciamento e de novas tecnologias. A Grameen formou uma parceria com a maior operadora de telefonia móvel de Uganda, a MTN, para criar a AppLab Uganda, uma iniciativa que estuda maneiras de usar tecnologias de comunicação móvel para melhorar a vida das pessoas, afirmou Eric Cantor, o diretor do programa. "As pessoas já têm celulares em seus bolsos, e já precisam de informações; também já existem organizações que fornecem essas informações", disse Cantor. "O que estamos fazendo é acelerar essas conexões". Construir aplicativos para a agricultura parece lógico em um país que é predominantemente rural e depende de pequenas fazendas, ele afirmou. Rutagumirwa está entre os diversos líderes de comunidades rurais treinados pela Grameen para pesquisar e educar agricultores vizinhos sobre os métodos corretos de combates às pragas da banana. Nos últimos anos, a difusão de duas pragas dizimou as safras de bananas da África Oriental, ameaçando a segurança alimentar e o sustento de cerca de 30 milhões de agricultores, de acordo com o Instituto Mundial de Agricultura Tropical. Em Uganda, por exemplo, as bananas respondem por 40% das áreas cultivadas no país e são alimento básico para mais de 12 milhões de pessoas. Os prejuízos causados pelas pragas são estimados entre os US$ 70 milhões e os US$ 200 milhões anuais. Na República Democrática do Congo e em Ruanda, dois países vizinhos, outra praga vem devastando as safras de bananas. A doença ainda não se estendeu ao território de Uganda, mas as autoridades estão de sobreaviso quanto a ela. Quando essa praga se estabelece em uma área, se torna quase impossível erradicá-la, disse Idd Ramathanni, microbiólogo do Instituto Internacional de Agricultura Tropical, em Uganda. Usar celulares para conectar agricultores de lugares remotos aos cientistas em Kampala melhora em muito a vigilância e oferece mais oportunidade de prevenir a devastação, afirmou ele. "Melhor prevenir que curar o problema depois que ele nos atingir", declarou. David Bangirana, outro líder agrícola treinado pelo Grameen, usa uma camiseta amarela com as palavras "Pode Perguntar" escritas no peito. A comunidade agora o procura com perguntas sobre práticas agrícolas e questões de saúde, e ele consegue encontrar respostas rápidas usando mensagens de texto para o Google e um serviço com operadoras que consultam bancos de dados. Bangirana diz que ocasionalmente leva o celular a escolas primárias nas aldeias, para mostrar às crianças as informações sem limites de que dispõem. "O uso do celular deu à comunidade o poder de conhecer o que não conheciam e de fazer quaisquer perguntas quanto ao ambiente que os cerca", afirmou ele.
The New York Times
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